segunda-feira, 14 de novembro de 2022

 


Quando caem as máscaras

 

Não importa o que eu ou você pensemos, ou achamos, ou lacramos. Fatos, e isso é elementar, meu caro Watson! E os fatos a que me refiro: Lewis Hamilton ainda é o melhor piloto em atividade, apesar da recente forma “rolo compressor” de Max Verstappen. Eu me refiro ao pacote completo: currículo, trajetória, caráter. Obviamente já critiquei Hamilton no passado por alguns posicionamentos extra pista, sempre deixando claro que minha opinião é subjetiva e ele é grandinho e, portanto, responsável por seus atos e declarações. Também já o critiquei em alguns entreveros em pista, notadamente Silverstone 2021, onde acho que ele se excedeu. Também critiquei uma certa benevolência dos fiscais e dirigentes em relação às punições mais brandas aplicadas a ele em comparação.

Agora ontem, ele teve uma atuação e uma postura digna de um campeão. Recebido com festa (justificada) no nosso país como um grande campeão (o que de fato é), portou-se com galhardia fora e dentro da pista. Se fora dela, mostrou paciência e solicitude com seus muitos fãs, dentro dela, ao “comboiar” seu jovem companheiro de equipe naquilo que seria a primeira vitória da equipe no ano (e com dobradinha para coroar o final de semana), mostrou comedimento e generosidade ímpares. E olha que estamos falando de vitória, que lhe ilude há mais de um ano, fato inédito em sua incrível carreira.

Indesculpável, portanto, a atitude egoísta e grosseira do mimado holandês Verstappen, que ao não pensar na equipe deixou seu companheiro Sergio Perez atrás de si na disputa de um glorioso (!!) sexto lugar, mas que representaria um pontinho a mais para o mexicano na renhida disputa pelo vice-campeonato com o monegasco Leclerc da Ferrari. A equipe Red Bull jamais logrou fazer um campeão mundial e um vice na mesma temporada e essa seria a coroação perfeita da temporada. Quais as razões que fazem um piloto declinar ajuda a um companheiro de equipe, que tanto o ajudou no passado, diga-se de passagem, e que já tem o campeonato fechado e lacrado para si? Não tenho resposta a essa questão.

Faço paralelos a alguns pilotos que assisti e que não faziam questão de serem simpáticos com o publico e com seus companheiros de equipe. Descontando-se a natural tendência ao egoísmo extremo que faz parte do DNA de quase todos os campeões, lembro-me da semisselvagem disputa em Senna e Prost, companheiros de equipe, mas disputando o título prova a prova, roda a roda. E a infeliz política de “boa vizinhança” promovida pela Williams em 86 e 87, que resultou da perda de um campeonato certo e líquido por ambos os pilotos, Piquet e Mansell que preferiram se destruir nas pistas favorecendo um narigudo e sagaz Prost da McLaren. Mas, novamente, ambos estavam disputando o título.  E, claro, lembro-me da infeliz temporada de 1973 onde Emerson Fittipaldi ganhou três das quatro primeiras provas, e depois a equipe privilegiou seu talentoso e rápido companheiro Ronnie Peterson, jogando o título de pilotos no colo de Jackie Stewart. Nesse caso, foi burrice de Colin Chapman que não soube valorizar seu campeão mundial e claramente, investiu errado, perdendo o furioso piloto brasileiro que se mudou de mala e cuia para a McLaren para vencer ali o primeiro dos muitos títulos da escuderia.

Tivemos os casos da Ferrari onde sua majestade Michael Schumacher sempre esmagava esportiva e politicamente seus segundos pilotos (Irvine, Barrichello e mesmo Masssa), escolhidos a dedo para serem escudeiros. Caso aliás, parecido com o de Checo Perez, que ninguém levou a sério após a corrida de Mônaco este ano, vencida por ele que declarou estar na “disputa” pelo título. Todos sabíamos que Verstappen era mais talentoso, mais importante para a equipe, incontestável número 1 e o brilhareco do simpático mexicano não passaria de um “flash in the pan”, como dizem os ingleses. Mesmo assim, com um carro foguete nas mãos, algumas boas atuações, uma Ferrari pateticamente errática, os problemas da Mercedes, fizeram com que a Red Bull tivesse chances reais de cravar campeão e vice. Sem stress. Exceto pelo ego gigantesco de nosso amigo dos países (e golpes) baixos.

Veremos a conclusão dessa novela inacabada daqui a menos de duas semanas no encerramento do campeonato em Abu Dhabi. De qualquer forma, a meus humildes olhos de ancião, Hamilton saiu grande e Verstappen minúsculo de Interlagos!